Mesmo em meio à guerra, ao isolamento imposto a toque de clarins, Margarida ouvia a música entrando em toda fresta de seu quarto. Não sabia dizer se era orquestra, cadetes feridos praticando algumas notas, se era a radiola de algum general de alta patente que, como todos ali, seguia doente esperando o armistício, Margarida não sabia dizer. Mas era o que menos importava, pensava, porque não era o dizer que falava mais alto naqueles momentos. Antes, bem antes, era o vento soprando a clarineta, ou o tiquetaquear das horas sobre as cordas do violoncelo. Margarida se calava, simplesmente, a ouvir aquele som escorrendo pelo batente, transbordando as venezianas, pintando de outras chamas o inferno que ia fora, nos frontes de batalha, e mesmo dentro de algumas pequenas casas, com suas camas, padiolas e mortalhas. Entre uma costura e outra, no passo de um e outro ilhós, Margarida ouvia o ar dizendo, as cordas pelo ar soando, que nenhuma ilha era assim tão solitária, e que mesmo sendo a guerra meio eterna, nunca eram eternos os frontes de batalha.
Leandro Durazzo
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