''Ex nihilo nihil, in nihilum nil posse reverti"
Nothing can be born of nothing, nothing can be resolved into nothing.
O Retrato de Jennie (William Dieterle, 1948)
Penso em Dante e em Blake que, com cinco séculos entre si, fizeram da narrativa bíblica a base fiel das suas respectivas ficções cosmológicas. Se a vividez literária da epopeia do primeiro é rápida em cair no seio do imaginário comum da sua época, o segundo é relegado em vida à condição de alucinado devido ao desvio pouco ortodoxo do seu imaginário poético. Nas mãos do conservadorismo institucional da religião organizada, a Bíblia aparece ainda em literalidade e, por isso, como um texto em fechamento, impermeável à reconstrução pelos tempos. Foi um brilhante deísta, Voltaire, que com o seu Dicionário Filosófico me colocou esta semana na posição de avaliar a idolatria na contemporaneidade - reflectindo acerca do gesto idólatra / adorador, secularizado e mundano que a sociedade de hoje partilha ao mesmo ritmo da actualidade noticiosa; interessa-me um retorno ao mistério, o véu do pensamento mítico, ao peso ancestral das estórias e figuras mitológicas sedimentadas pelas pedras e papiros do passado. Se a força inter-geracional da comunicação recorre à compartilha do mito historicamente legado, a bíblia é uma fonte riquíssima de mitologia colectiva, as suas figuras e parábolas tem o poder de somarem '' ensinamentos'', de serem ilustrações do discurso moral - sem paralelo na sua disseminação popular. Em suma, a narrativa bíblica deve ser conhecida - como devem ser conhecidas as epopeias e os clássicos. A''diabolização'' do texto bíblico é contra-natura: somos seres que aprendem por história(s).
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